É meia-noite e faz tempo...
Faz três horas que é meia-noite.
Lá fora o uivo dos ventos,
Aqui dentro o gemido da morte.
Será que é crueldade da sorte?
E está imóvel o ponteiro,
Corre um animal no palheiro,
E a viola soou um acorde...
Tocou sem nenhum violeiro!
Meu Deus do céu, isso é sina?
Rezarei um pai-nosso em surdina,
Pra espantar os demônios feios.
Deve ser a macumba da esquina!
O que é aquilo que passou na vidraça?
É o fantasma da amortalhada,
Que está grávida duma menina,
E as duas choram na estrada!
Não há nesta casa uma vela?
Pr'acender e iluminar essa treva,
Ai meu Cristo escutei uma risada!
E veio lá da encruzilhada!
Deve ser o preto que gira,
Acenderei um incenso de mirra,
Valha-me Deus, que isso é nada...
Foi só uma impressão danada!
Mais um copo quebrou na cozinha?
Ai que estou nesta casa sozinha,
Soltaram as almas na madrugada!
Bem que minha mãe me dizia,
Olhando ao redor de soslaio...
Quando caia com a chuva, os raios,
Reza antes de dormir minha menina...
Estou hoje pagando os pecados!
Eu, nada rezava e mentia,
Quando ela me indagava de dia,
Varrendo os quebrados dos cacos,
Rezei minha mãe com maestria!
Agora quem pena sou eu,
Fazendo sinal da cruz aqui no breu,
Com devoção e idolatria...
Só pode ser bruxa de magia!
Que luz verde é essa no céu?
Um trenó de papai Noel?
Parece um sonho de fantasia,
É disco-voador, santa Maria!
Deixando sinais no milharal,
Estão rentes ao matagal,
Sai de retro que esta casa é vazia!
Alguém recolhe as roupas do varal?
E ele olha pra mim com maldade,
Outro vulto parado no portão,
Observa-me com olhar de piedade...
Isso é pior que sal com limão!
Fechei na vidraça a cortina,
Deve ser outro feitiço da Tina,
A suicida do porão...
E ela gemeu com sofreguidão...
Mulher, vá descansar em paz,
Que te prende aqui, satanás?
Deus te valha que ele é imensidão!
Não tem nada maior que Deus não!
Onde está o terço de prata,
E os unguentos santos da mata,
Pra espantar esse cão?
É agora que invado o porão!
Mas no canto uma menina chora,
É Tina, a suicida da escola,
E suas lágrimas transbordam no chão:
Só quero ter paz no coração...
Tina diz tão triste essa frase,
Mas justo nessa hora o sol nasce,
Sem ter dado comunicação;
Tina desaparece num enlace
E tudo se ilumina, é verão...
Tatiane Sales
Faz três horas que é meia-noite.
Lá fora o uivo dos ventos,
Aqui dentro o gemido da morte.
Será que é crueldade da sorte?
E está imóvel o ponteiro,
Corre um animal no palheiro,
E a viola soou um acorde...
Tocou sem nenhum violeiro!
Meu Deus do céu, isso é sina?
Rezarei um pai-nosso em surdina,
Pra espantar os demônios feios.
Deve ser a macumba da esquina!
O que é aquilo que passou na vidraça?
É o fantasma da amortalhada,
Que está grávida duma menina,
E as duas choram na estrada!
Não há nesta casa uma vela?
Pr'acender e iluminar essa treva,
Ai meu Cristo escutei uma risada!
E veio lá da encruzilhada!
Deve ser o preto que gira,
Acenderei um incenso de mirra,
Valha-me Deus, que isso é nada...
Foi só uma impressão danada!
Mais um copo quebrou na cozinha?
Ai que estou nesta casa sozinha,
Soltaram as almas na madrugada!
Bem que minha mãe me dizia,
Olhando ao redor de soslaio...
Quando caia com a chuva, os raios,
Reza antes de dormir minha menina...
Estou hoje pagando os pecados!
Eu, nada rezava e mentia,
Quando ela me indagava de dia,
Varrendo os quebrados dos cacos,
Rezei minha mãe com maestria!
Agora quem pena sou eu,
Fazendo sinal da cruz aqui no breu,
Com devoção e idolatria...
Só pode ser bruxa de magia!
Que luz verde é essa no céu?
Um trenó de papai Noel?
Parece um sonho de fantasia,
É disco-voador, santa Maria!
Deixando sinais no milharal,
Estão rentes ao matagal,
Sai de retro que esta casa é vazia!
Alguém recolhe as roupas do varal?
E ele olha pra mim com maldade,
Outro vulto parado no portão,
Observa-me com olhar de piedade...
Isso é pior que sal com limão!
Fechei na vidraça a cortina,
Deve ser outro feitiço da Tina,
A suicida do porão...
E ela gemeu com sofreguidão...
Mulher, vá descansar em paz,
Que te prende aqui, satanás?
Deus te valha que ele é imensidão!
Não tem nada maior que Deus não!
Onde está o terço de prata,
E os unguentos santos da mata,
Pra espantar esse cão?
É agora que invado o porão!
Mas no canto uma menina chora,
É Tina, a suicida da escola,
E suas lágrimas transbordam no chão:
Só quero ter paz no coração...
Tina diz tão triste essa frase,
Mas justo nessa hora o sol nasce,
Sem ter dado comunicação;
Tina desaparece num enlace
E tudo se ilumina, é verão...
Tatiane Sales
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